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  1. Um artigo muito interessante sobre o metabolismo do glicogênio na atividade física... Na minha opinião, este artigo reforça a eficiência do aeróbico em jejum para mobilização lipídica como fonte de energia (queima de gordura). Da mesma forma, mostra que ciclar carboidratos pode também ser uma estratégia interessante para tal finalidade... Acredito que realizar ciclos de ingestão de carboidratos (baixo / médio / alto), em conjunto com aeróbicos em jejum ou após atividade de musculação é muito efetivo. Metabolismo do glicogênio muscular durante o exercício físico: mecanismos de regulação RESUMO Uma série de estudos tem sido realizada para compreensão do metabolismo de glicogênio muscular durante o exercício. Estudos clássicos apontaram uma associação entre as reservas iniciais de glicogênio muscular e o tempo de sustentação do esforço. O glicogênio muscular diminui de forma semi-logarítmica em função do tempo, mas a concentração desse substrato não chega a zero, o que sugere a participação de outros mecanismos de fadiga na interrupção do exercício prolongado. Nesse tipo de atividade, a depleção de glicogênio, primeiro, ocorre nas fibras de contração lenta, seguida pela depleção nas de contração rápida. A diminuição na taxa de utilização de glicogênio muscular está sincronicamente ligada ao aumento no metabolismo de gordura, mas o mecanismo fisiológico é pouco compreendido. Estudos recentes sugerem que uma diminuição da insulina durante o exercício limitaria o transporte de glicose pela membrana plasmática, causando um aumento no consumo de ácidos graxos. Alguns estudos têm demonstrado, também, que a própria estrutura do glicogênio muscular pode controlar a entrada de ácidos graxos livres na célula, via proteína quinase. Fisicamente, a molécula de glicogênio se apresenta de duas formas, uma com estrutura molecular menor (aproximadamente, 4,105 Da, Proglicogênio) e outra maior (aproximadamente, 107 Da, Macroglicogênio). Aparentemente, a forma Proglicogênio é metabolicamente mais ativa no exercício e a Macroglicogênio mais suscetível a aumentar com dietas de supercompensação. Maior concentração de hipoxantinas e amônia no exercício com depleção de glicogênio muscular também foi relatada, mas estudos com melhor controle da intensidade do esforço podem ajudar a elucidar essa questão. INTRODUÇÃO O metabolismo energético durante o exercício, em especial do glicogênio muscular, tem sido amplamente investigado1-3. Bergstrom et al.1 demonstraram que o tempo de sustentação de determinado exercício está relacionado com a quantidade de glicogênio muscular disponível para ressíntese da molécula de adenosina trifosfato (ATP). Nesse estudo verificou-se que níveis aumentados de glicogênio muscular, obtidos por combinação exercício-dieta (supercompensação), prorrogam o tempo de permanência no esforço, enquanto níveis reduzidos por jejum ou reposição inadequada de carboidratos dietéticos levam a uma diminuição no tempo de atividade. A partir desses achados, técnicos, treinadores e nutricionistas passaram a utilizar estratégias dietéticas para aumentar as reservas desse substrato. Com o prolongamento do exercício, as reservas de glicogênio muscular diminuem progressivamente e parte da energia despendida no esforço passa a ser fornecida pelos triglicerídeos musculares, por glicose e por ácidos graxos livres (AGL) circulantes no plasma4. Entretanto, o conhecimento acerca dos mecanismos bioquímicos e fisiológicos que controlam a alternância dos substratos energéticos predominantes é limitado. Estudos recentes sugerem que uma combinação entre ação hormonal (adrenalina, noradrenalina e insulina) e a própria estrutura molecular do glicogênio muscular regulam a entrada de substratos na fibra muscular5,6. Diante do exposto, a intenção deste trabalho foi levantar as principais teorias envolvidas no metabolismo de glicogênio muscular durante o exercício. Serão discutidas a ação hormonal na regulação metabólica e a estrutura química do glicogênio muscular. Os estudos que demonstram associação entre o metabolismo de glicogênio muscular e formação de compostos bioquímicos (hipoxantinas e amônia) também serão debatidos. Quando necessário, será abordada a interação entre o metabolismo de carboidrato e de gordura. Metabolismo do glicogênio muscular A musculatura esquelética e o fígado constituem os principais órgãos de armazenamento de glicogênio. Embora encontremos no fígado uma maior concentração desse composto (até 6%), as reservas são maiores, em termos absolutos, na musculatura esquelética. O metabolismo do glicogênio muscular durante o exercício foi elucidado a partir de uma série de estudos clássicos, publicados pelo grupo do Instituto Karolinska de Estocolmo1,7,8. Esses estudos constituíram a base atual do conhecimento sobre o metabolismo do glicogênio muscular durante o exercício9, sendo utilizados na sustentação da maior parte das publicações subseqüentes10-12. Entre os principais achados deste grupo estão: a correlação linear entre o tempo de fadiga em uma determinada intensidade (%VO2max) e as concentrações iniciais de glicogênio no músculo (Figura 1), bem como a redução dos estoques de glicogênio (g/100g músculo seco) de forma semi-logarítmica em função do tempo, tendendo a se aproximar de zero no mesmo instante em que passa a ser difícil a manutenção da intensidade do exercício. Estudos posteriores confirmaram esse comportamento de redução do glicogênio muscular em função do tempo de exercício2,10. Entretanto, destacou-se que a curva de glicogênio versus o tempo de exercício poderia apresentar comportamento trifásico, ou seja, um rápido declínio inicial, seguido por uma queda constante, e, finalmente, uma degradação mais lenta nos minutos finais. Inicialmente, a explicação para esse comportamento baseou-se na existência de um estado de hipóxia relativa nos momentos iniciais do exercício, levando a uma rápida degradação do glicogênio muscular, com conseqüente formação de lactato sanguíneo. Na parte intermediária da curva, a queda constante poderia ser derivada da estabilização nos processos metabólicos, com equilíbrio entre a utilização do glicogênio muscular de forma aeróbia e a produção de lactato. Na última parte da curva, os estoques reduzidos de glicogênio muscular levariam a uma lenta degradação, aumentando gradativamente a utilização de gordura e glicose sangüínea como fonte de energia8. Contudo, a primeira explicação atualmente pode ser contestada, pois um estado de hipóxia nem sempre é encontrado nas células musculares a ponto de impossibilitar a utilização do metabolismo oxidativo. A degradação rápida do glicogênio muscular, tendo como produto final o lactato, pode ser decorrente da ineficiência dos sistemas de transporte de íons H+ para dentro da mitocôndria, isto é, lançadeira glicerol-fosfato13, ou de uma inerente inércia das enzimas mitocondriais, responsáveis pelos processos oxidativos14. A idéia de que as reservas de glicogênio muscular aproximam-se de zero no instante em que iniciam os sintomas de fadiga foram falseadas1,2,3,7,10,15. Em todos os estudos subseqüentes a 1967, observou-se resquício de glicogênio muscular (~24%) ao final de exercícios prolongados (~70% VO2max), interrompidos pela exaustão do indivíduo2,15,16. Embora, na maior parte desses estudos, a fadiga tenha sido associada com a redução do glicogênio muscular, a pequena reserva restante seria suficiente para o prolongamento da atividade, sugerindo o envolvimento de outros mecanismos na interrupção de exercícios com essas características. Outra série de estudos, iniciada a partir da década de 70, em Estocolmo, pelo grupo liderado por Gollnick, complementou o conhecimento sobre depleção de glicogênio muscular. Utilizando a técnica de histoquímica qualitativa, denominada "periódica reação do ácido-Schiff" (periodic acid-Schiff's reaction - PAS), Gollnick et al.17verificaram que, após a redução do glicogênio muscular com manipulação exercício-dieta, seguida por três dias de dieta rica em carboidratos (~2.000kcal de carboidratos), as reservas de glicogênio muscular aumentavam, aproximadamente, 60% em relação a uma dieta mista. Ao final de 30 minutos de exercício na bicicleta ergométrica (74% VO2max), a concentração de glicogênio muscular foi maior quando uma dieta rica em carboidratos precedia o teste. A novidade desse trabalho foi a apresentação dos resultados de depleção seletiva do glicogênio muscular, ou seja, a maior parte do glicogênio utilizado advinha das fibras de contração lenta. Resultados similares também foram encontrados após uma corrida de 30km, embora a influência da dieta anterior ao exercício não tenha sido estudada18. Em estudo posterior, Gollnick et al.19 observaram que o glicogênio das fibras de contração rápida era o primeiro a ser depletado, após a realização de 6 séries de um minuto de duração (150% da potência aeróbia máxima), intercaladas por períodos de 10 minutos de repouso entre as séries. Em outra publicação, Gollnick et al.20finalizaram o modelo de depleção seletiva do glicogênio muscular, analisando diferentes intensidades de exercício na bicicleta ergométrica entre 30% a 150% do VO2max. Os autores descobriram que a depleção do glicogênio muscular era 7,4 vezes maior a 84% do VO2max do que a 31% do VO2max, e a depleção era mais significativa nas fibras de contração lenta. Porém, com o prolongamento da atividade, um progressivo decréscimo no glicogênio muscular era observado também em fibras de contração rápida. Nos exercícios de intensidade acima do VO2max, o glicogênio de ambas as fibras era depletado. Esses achados foram confirmados em estudos posteriores21. Apesar do conhecimento obtido nas décadas de 60 e 70, os mecanismos fisiológicos e bioquímicos envolvidos na regulação da degradação do glicogênio muscular durante o exercício não foram totalmente esclarecidos. Em exercícios submáximos (entre 65-75% VO2max), a degradação (absoluta) do glicogênio diminui com o prolongamento da atividade, enquanto os AGL circulantes no plasma e a glicose sangüínea aumentam sua participação na ressíntese do ATP. Isso parece mais evidente quando os níveis de glicogênio muscular pré-exercício encontram-se abaixo do normal22. Entretanto, pouco se sabe sobre os mecanismos que controlam essas alterações. Uma questão inerente é: qual desses dois substratos tem preferência na "substituição" do glicogênio muscular? Um elegante trabalho de Weltan et al.5 permite levantar algumas especulações (Tabela 1). Nesse estudo, os indivíduos foram designados aleatoriamente para um de quatro grupos, sendo que em três grupos a glicemia sangüínea foi mantida estável (euglicemia) através de infusão intravenosa de glicose. Desses três, um apresentava concentração inicial de glicogênio muscular normal, um depleção de glicogênio prévia e um depleção de glicogênio prévia mais infusão de insulina no exercício. No quarto grupo, também com depleção prévia de glicogênio, a taxa de infusão de glicose foi aumentada, a fim de manter uma situação de hiperglicemia. Os resultados demonstraram que a utilização do glicogênio muscular foi significativamente reduzida, nos grupos com depleção prévia de glicogênio. Além disso, foi verificado que, mesmo mantendo a glicemia sangüínea estável, o ácido graxo foi o substrato energético preferencialmente utilizado na situação de depleção de glicogênio, exceto quando foi mantida uma hiperglicemia ou hiperinsulinemia. Nessas duas últimas situações, a glicose sangüínea foi utilizada predominantemente como fonte energética. Esses achados, embora se distanciem de situações fisiológicas normais, sugerem que em situações de depleção de glicogênio muscular, o músculo ativo utiliza, preferencialmente, os lipídios como substrato energético. Esse processo ocorre, provavelmente, por controle da noradrenalina, pois sua concentração no sangue aumenta significativamente com o exercício, elevando, assim, as concentrações de AGL plasmáticos e auxiliando na manutenção da glicemia sangüínea. Em contra-partida, a insulina em excesso (por infusão ou hiperglicemia) exerce efeitos antagônicos, estimulando o consumo de glicose pelo músculo, e inibindo a lipólise. A preferência para a utilização de lipídios como fonte de energia, na ausência de concentração adequada de glicogênio muscular, tem sido sustentada na literatura4. O mecanismo fisiológico de restrição no consumo de glicose plasmática em situações de depleção de glicogênio muscular não está totalmente esclarecido, mas a hipótese mais provável seria a limitação no transporte de glicose através da membrana da célula. Estudos de Hespel & Richter23 com animais demonstram que, ratos com depleção de glicogênio aumentam o transporte de glicose pela membrana em 25% durante 15 minutos de contração isométrica máxima, quando comparados a ratos com supercompensação (combinação de exercício e dieta). Porém, esse aumento não foi suficiente para restabelecer o metabolismo de carboidratos, sendo necessário um aumento concomitante no consumo de lipídios e aminoácidos, conforme já relatado em humanos24,25. Como discutido anteriormente, o aumento exógeno de insulina no exercício pode facilitar o transporte de glicose através da membrana plasmática e restabelecer o metabolismo de carboidrato nas situações de depleção de glicogênio muscular5. Se, por um lado, a escolha da célula muscular em utilizar lipídios como fonte de energia proporciona uma "economia" de carboidratos, em especial de glicose sangüínea, por outro, constitui uma manobra que, inevitavelmente, prejudica a manutenção da intensidade do exercício e o desempenho26. Isso porque os ácidos graxos necessitam de maior quantidade de oxigênio para serem oxidados. A quantidade de energia liberada por litro de oxigênio e a velocidade de degradação da molécula é maior quando a glicose é metabolizada, ao invés de ácidos graxos, justificando porque em exercício de intensidade elevada (~85% VO2max) os carboidratos são, preferencialmente, utilizados4,27. Como é importante para atletas, em competições de longa duração, realizar a prova na maior intensidade relativa possível, os carboidratos acabam constituindo a principal fonte de energia. Esse pensamento está de acordo com o conceito de crossover do metabolismo, que estabelece uma modificação da predominância de lipídios para carboidratos, acontecendo próximo a 80% VO2max, e com pouca interferência do nível de aptidão aeróbia27. A partir dos dados experimentais levantados nesta sessão, demonstrando que o consumo de glicose pelo músculo ativo não é significativamente aumentado em condições de depleção de glicogênio muscular, é possível imaginar que, de forma defensiva e prioritária, o organismo privilegie a oferta de glicose ao sistema nervoso central (SNC), protegendo-o de possíveis "lesões" por deficiência de nutriente. Esse raciocínio está de acordo com a hipótese de um "governador central" controlando os mecanismos de fadiga28. Efeito da insulina e do exercício no transporte celular de glicose Conforme o discutido anteriormente, a elevação da glicemia sangüínea em conjunto com o excesso de insulina exógena, aumenta o catabolismo da glicose5. Tem sido documentado que, durante o exercício, a glicose é utilizada pela célula da fibra muscular de forma independente da insulina, provavelmente, por aumento no número de transportadores de membrana ativos, isto é, GLUT-429. O mecanismo envolvido não está totalmente esclarecido, mas uma possível via seria a produção da 5'-AMP-ativador da proteína quinase (PKA), o qual aumentaria a expressão gênica do GLUT-430. Entretanto, apesar dessa ativação independente durante o exercício, o transporte pode permanecer parcialmente controlado pela insulina. Dados recentes de Christ-Roberts et al.31 suportam essa concepção, demonstrando que o exercício com duração de 30 minutos a 70% VO2max, com infusão de insulina, aumenta o transporte de glicose pela membrana plasmática. Esse aumento no transporte foi devido a uma maior ligação entre o substrato 1 do receptor da insulina (IRS-1) com a subunidade PI3-quinase, desencadeando um potente efeito cascata no citoplasma, com subseqüente fosforilação dos receptores serina/treonina quinase (PKB) e aumento na translocação do GLUT-4. Aparentemente, a combinação insulina–exercício exerce um efeito amplificador, com maior consumo de glicose pela célula muscular. Provavelmente, apenas combinando exercício e infusão de insulina com manutenção exógena da glicose é que a predominância energética em exercícios prolongados passaria de lipídios para carboidratos. Estudo de Nielsen et al.30 demonstrou que, em exercício a 80% VO2max, a fosforilação da subunidade catalíticaa-PKA (Thr172) foi menor em um grupo de pessoas treinadas aerobiamente, quando comparado com um grupo de sedentários. Interessante que a concentração de glicose plasmática foi aumentada (5,9, desvio-padrão - DP= 0,5vs 4,7, DP= 0,3 mM) no grupo treinado. Esses resultados estão de acordo com os dados reportados por Coggan et al.32, que observaram, também a 80% VO2max, uma menor taxa de desaparecimento (Rd) da glicose do sangue em ciclistas bem treinados, e com a sugestão de Richter et al.33 de que a translocação do GLUT4 é menor em indivíduos treinados para a mesma carga absoluta. Nielsen et al.30 mostraram, igualmente, uma utilização de glicogênio muscular similar entre os grupos, mesmo com os treinados apresentando um maior estoque inicial. Isso está de acordo, pelo menos em parte, com o conceito de crossover28 e sugere um mecanismo poupador de glicose plasmática em indivíduos treinados aerobiamente. Frente aos dados apresentados, três importantes constatações podem ser destacadas, referentes ao metabolismo de glicogênio muscular: 1) há utilização preferencial de AGL em situações de depleção de glicogênio; 2) o consumo de glicose pelo músculo esquelético durante o exercício pode ser transporte-limitado e; 3) quando os estoques de glicogênio estão em níveis normais, principalmente nas intensidades mais elevadas, existe uma preferência por essa fonte de energia. Assim, a glicose sangüínea vem a ser, então, um rico e precioso combustível, que deve ser utilizado, predominantemente, pelo músculo ativo, quando alta concentração plasmática desse substrato possa ser mantida (por infusão ou ingestão). Estrutura funcional do glicogênio muscular Mesmo com o integrado controle, apresentado na sessão anterior, envolvendo sinalizadores e receptores de membrana, a própria estrutura do glicogênio parece contribuir também para esse controle. Uma proposta de auto-regulação, a partir da integração física e enzimática da molécula de glicogênio, foi, recentemente, apresentada por Shearer & Graham6. O modelo foi elaborado a partir do desenvolvimento de um método semi-quantitativo de determinação do glicogênio muscular, utilizando a técnica de microscopia de transmissão eletrônica, a qual permite conhecer o número, a distribuição e a área de cada grânulo de glicogênio. Inicialmente, o grânulo cresce em um formato linear, com aumento seqüencial de unidades de glicose, sendo a primeira ligação unida à glicogenina, uma proteína auto-glicosilante. A partir dessa primeira ligação, mais unidades de glicose podem ser adicionadas pela ação de duas enzimas-chave no processo de síntese, a glicogênio sintetase (GS) e a enzima ramificadora. O acréscimo seqüencial e ramificado de glicose realizado por essas duas enzimas faz com que os estoques de carboidratos dentro da célula aumentem de forma exponencial. A molécula passa, então, a apresentar um formato esférico, com o seu crescimento sendo inibido quando atinge um diâmetro de, aproximadamente, 42 nanômetros. Existem duas principais formas de armazenamento do glicogênio, as quais podem ser identificadas pela sua solubilidade em ácido perclórico, denominadas proglicogênio (PG) e macroglicogênio (MG). A primeira constitui uma molécula menor (~4.105 Da) com maior razão proteína/carboidrato. A segunda, uma molécula maior (~107 Da), com a mesma quantidade de proteína da PG, mas com mais carboidrato (menor razão proteína/carboidrato). Um estudo de Graham et al.34 demonstrou que PG e MG apresentam dinâmicas de degradação diferentes, que podem ser dependentes da intensidade de esforço. Nesse estudo, os autores demonstraram que a taxa de degradação de MG e PG era similar em exercícios a 70% VO2max, mas muito maior de PG quando o exercício era realizado a 85% VO2max. Em exercício intermitente (3 x 3 minutos a 100% VO2max), na primeira série as duas formas são utilizadas em proporções similares, mas com tendência a manter a preferência pela PG. Na segunda série, um declínio no metabolismo de MG e a manutenção de PG foram observados, apesar de não diferirem estatisticamente. Na última, as duas formas diminuíram a taxa de degradação. Os autores concluíram que a forma PG pode ser metabolicamente mais ativa e o metabolismo de MG pode ser rapidamente inibido com o passar do tempo, tanto em exercícios continuados, quanto repetidos. Esse fato não parece ser generalizável, uma vez que, como demonstrado na Figura 2 extraída do trabalho de Graham et al.34, é perceptível que a 85% VO2max, ocorre uma queda significativa na taxa de degradação do glicogênio, em função do tempo, apenas para PG, com MG mantendo-se constante. Resta ainda, em futuros estudos, determinar a mudança na degradação de MG e PG em exercícios prolongados, em especial de exercícios realizados até a exaustão. Um outro estudo do mesmo grupo também mostrou que, após exercício a 70% VO2max, realizado até a exaustão, seguido por uma dieta composta por 75% de carboidrato durante dois dias, a forma MG aumenta somente nas 24 e 48 horas após o exercício. Outro dado interessante é que, apesar de aumentar a forma macro, a micro (PG) é mantida em valores próximos a 350mmol unidades de glicose/kg de peso seco, muito semelhante à concentração total de glicogênio normal, sem supercompensação11. Aparentemente, o glicogênio "extra" foi armazenado na forma MG, mas preservando a concentração fisiológica de PG. Adamo et al.11 sugerem que esses resultados, junto com os obtidos no estudo de Graham et al.34, são fortes indicadores de que o PG é metabolicamente mais ativo. Entretanto, algumas lacunas deixadas em aberto merecem ser mais bem investigadas, como a questão de se o aumento no tempo de exaustão causado pela supercompensação está associado à forma MG de glicogênio, e a averiguação dos possíveis efeitos da depleção prévia de glicogênio muscular sobre o metabolismo de MG e PG. Outro ponto interessante é que o próprio metabolismo de glicogênio muscular pode se auto–regular. Conforme a "árvore" de glicogênio vai perdendo o conteúdo de glicose das extremidades, uma diminuição na atividade da enzima catalítica glicogênio fosforilase (GF) e o aumento na atividade da enzima GS são observados6. O mecanismo exato da interferência física da molécula de glicogênio na ação enzimática não está muito bem explicado, mas assume-se que está relacionado a uma maior ativação da PKA em situações de diminuição na reserva de glicogênio, uma vez que essa enzima apresenta um sítio de ligação com a molécula de glicogênio e outro com a GS e GF. A PKA é uma importante proteína responsável pelo transporte de glicose e AGL para dentro da célula, o que poderia aumentar a oxidação e diminuir a síntese de substratos. Assim, a entrada de substrato na célula pode ser mediada parcialmente pelo conteúdo de glicogênio muscular. Para a glicose 1-fosfato, liberada do glicogênio muscular, iniciar na via glicolítica, é necessário a conversão para glicose-6-fosfato, pela enzima fosfoglicomutase. Parece razoável imaginar que uma diminuição da atividade da GF acarretaria em menor formação de glicose 1-fosfato, e, conseqüentemente, de glicose 6-fosfato. A diminuição na concentração de glicose 6-fosfato no músculo esquelético é um potente estimulador alostérico da hexoquinase, a enzima responsável pela fosforilação da glicose vinda do sangue. Como a reação glicose 6-fosfato « frutose 6-fosfato apresenta-se em equilíbrio, a diminuição da glicose 6-fosfato leva a uma concomitante diminuição da frutose 6-fosfato. Como essa última enquadra-se como um regulador alostérico da fosfofrutoquinase (PFK), essa enzima pode diminuir sua atividade nas situações em que a concentração de frutose-6-fosfato decai. Assim, a predominância de glicose sangüínea entrando na via glicolítica pode ocasionar uma simultânea redução na velocidade de degradação, causada pela menor atividade da enzima PFK. Como conseqüência, a redução da glicose a piruvato aconteceria de forma mais lenta, facilitando a entrada dessa molécula dentro da mitocôndria, o que evitaria a formação de lactato. Isso pode explicar porque alguns estudos apresentam uma menor concentração de lactato em exercício submáximo e máximo em situações de depleção de glicogênio muscular25. Realmente, existem evidências de que a formação de lactato a partir do glicogênio muscular é 10 vezes maior do que a partir da glicose35. Efeito da intensidade do esforço no metabolismo de glicogênio muscular e alterações bioquímicas intracelulares Para uma determinada porcentagem do VO2max, na maior parte dos estudos sobre depleção de glicogênio muscular foi observado que, nessa situação, ocorre uma diminuição significativa no tempo de manutenção do esforço1,15. Além de todas as alterações metabólicas levantadas até o momento contribuirem para a diminuição na perfomance, uma interessante hipótese seria a existência de um declínio nos intermediários do ciclo de Krebs, levando, conseqüentemente, a uma menor ressíntese de ATP pela via aeróbia. Seguindo essa linha de raciocínio, isso aumentaria a concentração de ADP intramuscular, estimulando a reação da mioquinase e causando um acúmulo de inosina monofosfato (IMP), com formação de amônia (NH3). Entretanto, essa afirmação foi refutada recentemente em trabalho de Baldwin et al.3, que não conseguiram observar decréscimo na soma de quatro intermediários do ciclo (citrato, isocitrato, fumarato e malato) - os quais representam 70% do total - após ~100 minutos de exercício com depleção prévia de glicogênio ou ~150 minutos com supercompensação prévia de glicogênio, em uma intensidade referente a 70% VO2max. Nesse mesmo estudo, a soma do total de adenina nucleotídeo (chamada de TAN, que é igual a ATP + ADP (adenosina difosfato) + AMP (adenosina monofosfato) não foi alterada em nenhuma das situações. Esse mecanismo continua intrigante porque existem resultados conflitantes na literatura. Por exemplo, Spencer & Katz36 observaram que, após um exercício de duração de ~5,5 minutos na intensidade correspodente a ~95% VO2max, o acúmulo de IMP foi maior em situações de depleção prévia de glicogênio, quando comparado com super-compensação prévia. Apesar do acúmulo de frutose 6-fosfato ter sido menor com depleção prévia (o que levaria a uma inibição da PFK), a glicólise não foi alterada devido à compensação exercida pelo acúmulo de ADP e AMP livre na célula, que funcionam como ativadores alostéricos da PFK. Resultados opostos foram encontrados por Febbraio & Dancey12, em que um exercício realizado a ~65% VO2max (93% do limiar de lactato) até a exaustão não causou um significativo aumento em IMP ou hipoxantinas, e também não reduziu o TAN. Apesar de uma significativa relação entre tempo de exaustão e uso de glicogênio muscular ter sido encontrada (r=0,95;p<0,05), a associação entre IMP e glicogênio muscular, no final do exercício, não foi significativa (r=0,73;p>0,05). As diferenças entre os estudos podem ser devidas, simplesmente, à forma de controle da intensidade do exercício. Por exemplo, Broberg & Sahlin37 encontraram resultados diferentes de Febbraio & Dancey12, associando o acúmulo progressivo de NH3 com o baixo nível de glicogênio muscular ocasionado pelo exercício. A intensidade utilizada, entretanto, foi muito semelhante (~67% VO2max), mas a forma de determiná-la foi muito diferente. No estudo de Febbraio & Dancey12, a intensidade foi estabelecida a partir do limiar de lactato, o que, de certa forma, individualiza a intensidade de esforço, uma vez que, uma porcentagem fixa, estabelecida unicamente a partir do VO2max, como a utilizada no estudo de Broberg & Sahlin37, pode representar uma "carga interna" muito diferente entre os indivíduos38. Essas diferenças metodológicas podem submeter os indivíduos a diversos domínios fisiológicos, sendo que os mecanismos de fadiga podem ser totalmente diferenciados, quando comparadas intensidades referentes aos limiares de lactato. Isso explica, também, porque, dependendo da intensidade estudada, a depleção de glicogênio pode ou não estar associada à fadiga15. Evidências mostram que o exercício realizado acima do VO2max (supra-máximo) parece ter uma dependência menor da disponibilidade inicial de glicogênio muscular. Em estudo de Vanderbergue et al.39, a 125% VO2max, a supercompensação de glicogênio levou a um aumento de 56% na concentração muscular inicial desse composto, sem, no entanto, aumentar a tolerência ao esforço (~175 s), ou modificar o acúmulo de lactato e de pH sangüíneos. Resultados similares foram encontrados por Hargreaves et al.40, que não identificaram nenhum efeito da supercompensação de glicogênio muscular sobre a potência de pico, potência média e máximo déficit acumulado de oxigênio em exercício de 75 segundos (75 all-out). Entretanto, em atividades com exigência mista ou participação efetiva da capacidade lática (aeróbio-anaeróbio com duração entre 3 a 10 minutos, isto é, próximo ao VO2max), a depleção de glicogênio muscular pode interferir significativamente no desempenho. Newsholme et al.35 estimaram a quantidade de glicogênio muscular utilizada pela via aeróbia e anaeróbia, em uma corrida de 5 mil metros (~13min) e demonstraram que ambas podem consumir quase todo o glicogênio armazenado no músculo. Assumindo que essa estimativa esteja correta, a fadiga por depleção de glicogênio poderia acontecer antes do acúmulo excessivo de prótons no músculo. Estudos com o objetivo de determinar a intensidade a partir da qual as reservas de glicogênio muscular deixam de ser importantes para o desempenho devem ser conduzidos, principalmente, comparando esforços abaixo e acima do VO2max. Digno de nota, nem todo glicogênio intracelular exerce função de regenerar ATP para contração muscular. Uma importante e significativa parcela destina-se a manter o funcionamento da bomba de cálcio e interfere, apenas indiretamente, no processo de contração - relaxamento41,42. Alguns autores sugerem que, mesmo com glicogênio total intracelular suficiente para manter a atividade muscular, a depleção dos depósitos próximos à bomba de cálcio pode ocorrer precocemente, impossibilitando a continuidade do exercício12. Apesar de evidências indiretas sugerirem a existência desse mecanismo em humanos43, infelizmente, dentro do nosso conhecimento, não existem estudos que possam comprovar essa hipótese. Reposição do glicogênio muscular e estratégias de supercompensação Embora não tenha sido o escopo principal dessa revisão, a compreensão das estratégias nutricionais de ressíntese do glicogênio muscular é de suma importância para o processo de recuperação de atletas em fase competitiva e pré-competitiva. A porcentagem de carboidratos em uma dieta balanceada comum aproxima-se de 60% do valor energético total, mas para aumentar as reservas de glicogênio muscular pré-competição, a porcentagem de carboidratos nos três dias que precedem a competição deveria aproximar-se de 80%39. O índice glicêmico do alimento44 e o tipo de monossacarídeo utilizado45 são impor-tantes variáveis que precisam ser levadas em consideração. Stevenson et al.44 observaram que o aumento da glicose sangüínea aos 30 e 120 minutos após o término do exercício era acentuado quando alimentos de alto índice glicêmico eram utilizados na reposição de carboidratos. O pico de insulina após 120 minutos do fim do exercício também foi maior após a ingestão de alimentos de alto índice glicêmico. Os autores sugeriram que o maior nível de insulina poderia aumentar a síntese de glicogênio muscular. Alguns autores demonstraram que a inclusão de proteínas na refeição pós-esforço acelera a reposição do glicogênio muscular46, mas nenhum efeito dessa estratégia foi observado por Wojcik et al.47, comparando suplementação de carboidrato com proteína + carboidrato. Portanto, a eficácia da ingestão de proteínas em conjunto com carboidratos, sobre a reposição do glicogênio muscular, é uma questão ainda não esclarecida. Conlee et al.45, utilizando um modelo animal, constataram que o uso de frutose nas duas primeiras horas após o término do esforço ou jejum prolongado (24 horas) não aumenta significativamente as reservas de glicogênio muscular. Por outro lado, a ingestão de glicose aumenta consideravelmente as reservas de glicogênio muscular em ambas as situações (jejum ou exercício). Interessante que a frutose provocou um aumento na taxa de ressíntese do glicogênio hepático, quando comparada com a glicose. Além disso, a taxa de restauração do glicogênio hepático foi maior após o jejum do que após o exercício. Esses resultados sugerem que a frutose tenha uma maior importância no restabelecimento das reservas hepáticas de glicogênio, enquanto a glicose, na ressíntese do glicogênio muscular. Contudo, recomenda-se cautela ao aplicar esse modelo de reposição de glicogênio em humanos, uma vez que o mesmo foi testado apenas em animais. Por fim, um interessante estudo de Lambert et al.48 demonstrou que uma dieta rica em gordura (>65% MJ de gordura) durante 10 dias, seguida por 3 dias de dieta rica em carboidratos (>70% MJ de carboidrato), diminui significativamente a utilização de glicogênio muscular e o tempo necessário para percorrer 20km no ciclismo. Essa comparação foi feita em relação a um procedimento controle com a ingestão de uma dieta mista (~30%MJ de gordura) nos 10 dias anteriores aos três dias de sobrecarga de carboidrato. Esse estudo abre um novo campo de investigação referente a possíveis combinações de dieta, como estratégia para aumentar as reservas de glicogênio muscular pré-competição e melhorar o desempenho esportivo. A partir desses achados, fica clara a importância da reposição de carboidratos após o exercício. Uma dieta rica em carboidratos (~80% do valor energético total) com alto teor de glicose após o exercício prolongado, deveria ser aplicada para a ressíntese mais efetiva do glicogênio muscular e recuperação do atleta. CONSIDERAÇÕES FINAIS As reservas de glicogênio muscular são estreitamente relacionadas ao desempenho e tempo de sustentação do esforço em determinado exercício. A transferência de predominância do metabolismo de glicogênio muscular para o de lipídios acontece com o prolongamento da atividade, à medida que diminuem as reservas de carboidrato. O mecanismo fisiológico que limita a entrada de glicose na fibra muscular ainda não está totalmente esclarecido, mas, provavelmente, um balanço entre a diminuição da insulina com o exercício e a modificação física na estrutura molecular do glicogênio muscular regule esse processo. Essa limitação no transporte de glicose pode prevenir o estado de hipoglicemia, por poupar a utilização desse substrato pelo músculo. Algumas evidências apontam para uma relação entre glicogênio muscular e bomba de cálcio no processo de contração - relaxamento, mas estudos em humanos são necessários para comprovar essa hipótese. Estudos com hipoxantinas e amônia também não permitem muitas conclusões, e desenhos experimentais, com melhor controle da intensidade do exercício, podem elucidar essa questão. COLABORADORES A.E. LIMA-SILVA concebeu a idéia do trabalho, e desenvolveu a metodologia, a revisão da literatura e a redação. T.C. FERNANDES participou nas discussões referentes ao desenvolvimento da idéia do trabalho, auxiliou na análise crítica da literatura e na redação. F.R. OLIVEIRA participou nas principais discussões referentes à idéia do trabalho e no desenvolvimento da metodologia. Contribuiu significativamente com o modelo teórico e com a orientação do trabalho. F.Y. NAKAMURA participou nas principais discussões referentes à idéia do trabalho, auxiliou na revisão de artigos e na redação final do trabalho. M.S. GEVAERD participou nas principais discussões referentes à idéia do trabalho, na redação final e na orientação do trabalho. REFERÊNCIAS 1. Bergstrom J, Hermansen L, Hultman E, Saltin B. Diet, muscle glycogen and physical performance. Acta Physiol Scand. 1967; 71(2):140-50. [ Links ] 2. Bosch AN, Dennis SC, Noakes TD. Influence of carbohydrate loading on fuel substrate turnover and oxidation during prolonged exercise. J Appl Physiol. 1993; 74(4):1921-7. [ Links ] 3. 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